Em tempos de reflexão sobre a Reforma Protestante, resolvi escrever sobre o quanto esse evento ainda precisa acontecer no meio evangélico, principalmente a ala pentecostal do protestantismo brasileiro.
O movimento pentecostal tem, entre outras características, o anti-catolicismo. Muitas pregações são inflamadas pelo combate a religião romana. A linguagem bélica deixa bem claro que a Igreja Católica Romana é anti-bíblica, é a meretriz do livro de Apocalipse, uma igreja (para alguns, seita) corrompida pela idolatria. Contudo, em minha curta caminhada cristã pentecostal, percebi muitas semelhanças entre nós pentecostais e os católicos romanos.
O texto que escrevi não tem como objetivo desmerecer ninguém. Não é para rebaixar pentecostais ou elevar católicos romanos, mas justamente despertar a camaradagem entre esses movimentos, que, de uma forma ou de outra, tentam se aproximar do divino. Vamos as semelhanças:
Salvação
Dentro da história da teologia, a soteriologia (doutrina da salvação) sempre ocupou lugar de destaque nos palcos das discussões entre os pais da igreja, bem como na Reforma Protestante. De certa forma, o pentecostalismo é fruto da Reforma, mas sua soteriologia em muito se assemelha com Roma. Tanto o catolicismo romano como o pentecostalismo confessa que Jesus Cristo Salva e que o ser humano pode fazer algo em prol desse acontecimento. Em ambos os movimentos têm-se a possibilidade da salvação por obras. Enquanto no catolicismo romano enfatiza-se o fazer o bem ao próximo como um dos meios de salvação, o pentecostalismo aposta na piedade pessoal, tenho que ter uma vida santa e irrepreensível, se eu bobear, perco a salvação. Não foi nem uma nem duas vezes, que, ao falar sobre justificação por fé, recebo o comentário de volta: “é né irmão, mas temos que fazer a nossa parte”.
Imagens
Geralmente quando interrogado sobre a adoração a imagens, o católico diz que não adora a imagem, mas o que ela representa. A história da igreja revela que existe verdade nisso. As imagens eram uma ferramenta pedagógica na comunicação da fé aos iletrados. A grande realidade, é que o ser humano precisa de símbolos (aquilo que aproxima do centro), sua fé no invisível é estimulada pelo palpável, pelo visível.
É interessante que o movimento pentecostal, ainda que se diga iconoclasta, trocou as imagens de gesso por imagens de carne. Tiram-se os “santos” do altar e colocam-se os obreiros, os “santos” homens de Deus. O princípio é o mesmo: estimular a fé dos fieis. Já ouvi uma irmã dizer: “quando chego na igreja, e vejo aqueles homens lá na frente, me sinto segura, porque sei que tenho pessoas que oram por mim...”.
No movimento pentecostal temos até mesmo os “santos” preferidos. Explico. Muitas pessoas só aceitam oração de determinado obreiro ou obreira: “Vamos lá na vigília da irmã ou do irmão X porque lá Deus fala.” Já ouvi pessoas que não aceitaram receber oração de um presbítero ou diácono, tinha que ser do pastor.
Ainda uma pequena informação. É interessante notar que símbolos judaicos são bem aceitos no movimento pentecostal, enquanto que a imagem da cruz não. Em algumas construções pentecostais tem-se dificuldade em colocar-se uma Cruz, o maior símbolo do cristianismo, enquanto um candelabro é aceito sem questionamentos.
Papa (s)
A igreja Católica Romana acredita e defende a sucessão apostólica, pois acredita que assim se possa preservar o legado dos apóstolos. O Papa tem a palavra final e Deus fala mediante sua vida. Roma só tem uma papa.
Devido a influência coronelista, o movimento pentecostal fez para si muitos líderes que tem a mesma autoridade que o Papa católico. Em muitos lugares, líderes carismáticos tem o controle total sobre a igreja. Em muitas reuniões não se discutem idéias para o melhor funcionamento da igreja, ninguém arrisca dar uma opinião, estão ali simplesmente para dizer amém para tudo o que o líder disser, afinal é por meio dele que Deus fala. Se ele errar, dele Deus cobrará. Obreiros e mais obreiros fazem do seu ministério uma tentativa de achar graça aos olhos desse grande líder.
Quando o Papa morre, um conclave é feito para se escolher o novo Sumo Pontífice. Com um novo cabeça, a igreja ganha uma “nova cara”. No movimento pentecostal também é assim. Quando esse pastor morre, outro assume, e uma nova igreja surge. Como diz Paul Freston, trocamos a infalibilidade papal pela infalibilidade pastoral.
Vestes litúrgicas
A vestimenta do clero católico é cheia de simbolismo e significado. As batinas variam suas faixas de acordo com o momento litúrgico do ano, cada detalhe tem significado, muitas vezes desconhecido do povo em geral. Um padre não celebra a missa sem as vestes litúrgicas.
No pentecostalismo clássico, dificilmente alguém pregará sem gravata! A influência européia no país tropical até hoje está em voga. Já ouvi histórias de pessoas que foram convidadas para pregarem e estavam desprevenidas “liturgicamente” gerando aquele corre corre atrás de uma gravata.
Outras semelhanças existem, ainda mais depois do advento do neopentecostalismo, mas o acima exposto já é o suficiente para mostrar que temos mais em comum do que gostaríamos de admitir. Precisamos aprender a respeitar o próximo e olharmos para nosso próprio umbigo, podem ter certeza, acharemos sujeira!
PS esse texto escrevi antes da análise de Augusto Nicodemos em seu livro O que estão fazendo com a Igreja.
11 comentários:
Fala Professor. Estamos com saudades.
Sobre o texto, eu tenho uma grande CRISE com relação ao Romanismo (não consigo empregar o termo catolicismo-universal).
Vejo missas/cultos que em muito se distanciam dos evangélicos- as vezes para melhor. Esses dias estava zapeando, e entre 2 ou 3 pastores Teóricos da Prosperidade, me peguei na Rede Vida. Era um leigo quem estava pregando para casais, mas se hoje tem pessoas se autonominando até apóstolos eu o autodenomino um pastor. Sua esposa tinha também um domínio da Escritura e um amor (sim leigos pregam e são casados)que as vezes não se vêem mais nos templos, sejam tradicionais, neo ou pentecostais. Só não aguentei quando o padre propriamente dito pegou o microfone (pior que TP ou TR é ouvir sobre rosário).
Essa última semana tivemos aula no seminário com outro pr assembleiano, o qual tem uma aversão grande por Roma. Mas com argumentos e pesquisas onde mostrou que o pecado da igreja romana é para não levantar mais.
Em seu texto, Rodrigo, vc fala somente de alguns poucos pontos de semelhanças entre Roma e os "crentes". Infelizmente poderíamos ficar horas falando sobre essas semelhanças. Pior é que poucas são boas semelhanças. A maioria fere as doutrinas bíblicas, seja descarado de um lado ou velado de outro.
Parabéns pelo texto, e que Deus continue fazendo essa cabeça pensar e questionar, e que seja um instrumento de reforma na doente igreja atual...
Abraços
beto
Olá Beto,
realmente existem outras semelhanças.
a minha pergunta é: se os pecados da igreja católica nao tem volta, os nossos terão?
é claro que o movimento pentecostal nao eh igual ao catolicismo romano, caso fosse para que mudar? mas com certeza uma reforma se faz necessário.
paz
Rodrigo de Aquino, a paz!
Ótimo texto e análise sobre a catolicidade pentecostal.
É uma pena que os pentecostais absorvam o pior do catolicismo romano, principalmente o seu misticismo popular. Os santos foram substituídos pelos “conferencistas internacionais”; a transubstanciação é largamente aceita; o papismo foi trocado pelo caciquismo; a visão dualista é constante etc.
Bom seria que os pentecostais dialogassem teologicamente mais com a tradição reformada e os reformados resolvessem aprender com os pentecostais. Essa saudável união é o que Robinson Cavalcanti chama de “bloco histórico”.
Gutierres Siqueira
www.teologiapentecostal.blogspot.com
Muito bom Bibo, eu creio que existe uma relação muito grande disso também com a cultura no Brasil ou a falta dela.
Os brasileiros tem uma necessidade muito grande de ter ídolos.
Existe um exemplo clássico do pessoal da Hillsong, que cogitou não voltar por algum tempo no Brasil pela idolatria que eles estavam sentindo em relação a eles.
Grande Abraço
Zé.
Gutierres,
Na faculdade onde trabalho, promovemos todo ano um Fórum onde se dialoga sobre a reforma protestante e o movimento pentecostal, chamamos de Fórum de Pentecostalidade e Reforma, estamos no terceiro ano, e tem sido muito bom. Já é um passo.
e já ligando ao que o Zé escreveu, a cultura brasileira é terra fértil para o misticismo da idade média que permeia o pentecostalismo. Tanto q os pentecostais ao chegarem a nossa nação nao pararam mais de crescer, visto o pentecostalismo promover uma espiritualidade onde esse povo alegre e festeiro se encaixa muito bem, sem contar a influencia afro, com seus batuques e danças.
e como disse Elienai Cabral Jr em seu txt Meu Pentecostalismo Revisitado, a falta de reflexão do movimento pentecostal gerou o Neo-pentecostalismo, uma fissura ainda maior entre a Reforma e o pentecostalismo. a distancia é tão grande que alguns teóricos já o classificam (o neopentecostalismo) como falso-pentecostalismo.
É assim mesmo que a gente cresce... Parabéns, Bibo! Afinal de contas, poucos tem coragem pra botar a cara pra fora do esconderijo e falar (ou escrever) a verdade. Continue promovendo boas e profundas discussões como essas, pois a nova geração precisa de desafios - sejam eles espirituais, teológicos, científicos ou morais - para adquirirem para si uma identidade evangélica real. Acho até que vou aproveitar a idéia para fomentar minhas palestras e pregações nessa linha (rss). Sucesso. Fica na Paz do SENHOR!
Olá Prof. Sérgio,
obrigado pelas palavras de incentivo. tudo que escrevi, e escrevo é com temor e esperança. Fico feliz em ter pessoas como você fazendo coro por uma reforma e a extirpação da hipocrisia, muito fomentada em nome do poder eclesiástica.
QUE RIDICULO, UM ASSEMBLEIANO PENSANDO ASSIM !!!!!!!!!!!
VOCÊ SÓ ANALISA A QUESTÃO RELIGIOSA E HUMANA E NÃO A ESPIRITUAL.
VC TEM QUE ANALISAR O SEGUINTE: EXISTEM OS CRENTES FRACOS NA FÉ,QUE SÃO OS RELIGIOSOS, ESTES SIM PODEM TER SEMELHANÇAS COM OS CATÓLICOS.
MAS EXISTEM OS CRISTÃOS SALVOS QUE TEM A MENTE DE CRISTO ESTES É QUE FAZEM A DIFERENÇA OS QUE VIVEM SEGUNDO A PALAVRA DE DEUS E TEM INTIMIDADE COM ELE. PENSE NISTO MEU IRMÃO !!!
Irmão Jeremias,
Você tem o todo o direito de expressar sua opinião em relação a qualquer assunto, só lhe dou uma dica, seja mais educado como Jesus foi ao tratar com o diferente!
Antes de ser assembléiano sou cristão e crítico, e como você, tenho o direito de expressar o que penso.
E irmão, é com pesar que faço essa análise, mas é o que está acontecendo com o meio evangélico pentecostal, não sei se sabes ou tem lido outra coisa que não seja material da CPAD. Mas qualquer cristão que lê e interage com outras boas literaturas cristãs, reconhece que o movimento pentecostal está doente.
Mas viva os espirituais! Espero que eles se manifestem e façam a diferença!
Jeremias!
O que você gostaria de dizer com crentes fracos? Da a entender que - para você - somente os crentes "fortes" herdarão o reino dos céus. O que fazer então com o próprio apóstolo Paulo? Ele gloriavasse da sua fraqueza (II Co. 12:10), e considerávasse um miserável (Rm. 7: 24). Todos, sem excessão, somos fracos e dependentes única e exclusivamente de Deus.
Eu posso orar e estudar muito, e ainda assim, me parecer com os católicos. Poderei achar que somente a minha igreja possui a salvação (Na Assembléia de Deus não existe isto, não é mesmo?). E olha que nós assembleianos oramos muito hein!
Enfim! Seria ótimo ler este texto sem qualquer tipo de defesa denominacional ou linha teológica. É um conselho que lhe dou!
Um abraço!
Vitor Hugo
muito interessante caro colega teólogo... me faz lembrar uma análise do Oneide Bobsin sobre o fenomeno neopentecostal e a espiritualidade umbandista... reservadas as proporções é claro...
Agora que estou formado também tô começando a vida de blogueiro... ainda estou em fase de organização, meu endereço é pietismoluterano.blogspot.com
Deus te abençoe
Alex.
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